Fecho a porta e caminho em direção ao banheiro. Olho à esquerda e por uma fresta vejo, semi-nua, a estranha que trouxe comigo da festa. “Quem era?” – grita ela do quarto, espreguiçando-se em minha cama.
- Só uma amiga – respondo, enquanto entro no chuveiro.
- Meio tarde, não?
- Também acho – murmurei para mim mesmo e, enquanto a água limpava meu corpo, as lágrimas me lavavam a alma. – Muito tarde.
****
À tarde, na volta pra casa, em um táxi qualquer, eu disse à ela: “besteira, você pode escolher o cara que quiser”. E estava certo. Azar o meu. “Nos vemos à noite” – falei, enquanto me despedia com um sorriso no rosto. Se, muitas vezes, choramos de felicidade, creio que, naquela hora, sorria de tristeza. Talvez, lamentando por tudo que poderia ter dito e não disse. Pelo que poderia ter feito e não fiz... não fiz.
Lembro que saí do carro de maneira surreal, sem rumo, sem direção, ou melhor, na direção contrária daquilo que me corroía. Embebido no meu próprio medo. Entrei em casa e fechei a porta como uma presa que finalmente encontra um abrigo seguro.
Mais tarde, logo que cheguei à festa, a vi do outro lado do salão e caminhei em sua direção. Porém, quando me aproximei, notei que ela não estava sozinha. Havia outro ao seu lado.
Vida de merda! – pensei. Olhei à minha volta, e me aproximei da primeira guria que pareceu ao menos um pouco agradável, na tentativa infame de, talvez, provocar nela o mesmo ciúme que me dominava naquele instante.
Estranhamente, ela me olhou, cerrou os olhos, virou o rosto e beijou o sujeito, sem graça, que a acompanhava.
A noite avançou. Bebi um pouco, não, bebi muito. Quisera eu, que aquela que almejo, tivesse por mim a mesma presteza que esta, com quem falava.
Perguntei-me – num devaneio alcoólico – se, posto que ela, de quem gosto, gosta de outro. Deveria meu dia, ou melhor, minha noite, ser mais cinza por isso? Devia, eu, me afogar em lamentos? Penso que não. E como resposta a tudo isso que me incomodava, beijei esta estranha que sequer sabia o nome. Se a fosse nomear, chamaria de SUBSTITUTA. Não passava disso e, ao invés de preencher o que me faltava, apenas aumentava o vazio.
****
Já em casa, ouço a campainha da porta tocar. São 2h da madrugada e me pergunto quem poderia ser a uma hora dessas. Olho pelo olho mágico da porta e me surpreendo. Rapidamente abro a porta e lá está ela, parada, olhando para mim e sorrindo.
- Acabei com ele – disse, com a voz mais doce do mundo – posso ficar com você?
Imediatamente o coração dispara, minhas pernas fraquejam, emudeço. Minha surpresa é tamanha que quase me falta o ar para respirar. Quem eu mais quero está aqui, diante dos meus olhos, pedindo para ficar comigo. Então, em um lento movimento, meus lábios se abrem e de minha boca sai uma única palavra:
- Não.
segunda-feira, 31 de maio de 2010
quarta-feira, 26 de maio de 2010
Boa Noite
Lá fora o carro de som anuncia o fim do mundo. Outra convocação para uma missa da Igreja Universal.
-Universal! exclama meu irmão, enquanto mostra um aparelho em suas mãos – um carregador universal. Carrega qualquer tipo de bateria de celular.
Ligou o aparelho em uma tomada a fim de testá-lo e já fazer uso da nova aquisição. Luzes coloridas saem do carregador, azul, vermelho, verde, amarelo, é fascinante. “Todos os tipos de bateria! Que aparelhinho incrível” – penso, enquanto sorrio e me preparo para dormir.
Aos pés da cama, há um pequeno guarda-roupa que divide o quarto ao meio, de costas para mim e de frente para a lateral da cama de meu irmão. Enquanto espero o sono chegar, observo, no escuro, as luzes coloridas do carregador refletidas, agora mais intensamente, nas costas do guarda-roupa. As cores ditam um ritmo frenético que proporcionam um verdadeiro show de luzes.
O tempo passa, o sono não chega. Já escuto um ronco baixo vindo do outro lado do quarto. O barulho aumenta. Já é a décima vez que mudo de posição na cama. Mesmo com os olhos fechados ainda noto a luz do carregador piscando incessantemente. Abro os olhos. Na rua, o som de uma ambulância combina com a luz dentro do quarto.
Chamo meu irmão uma vez, para ver se ele acorda. Sem sucesso, volto a me revirar na cama. Mais alguns minutos se passam, o barulho agora já se confunde com o som dos carros que passam. Apóio os pés no guarda-roupa. Ele balança.
Insuportável! Mas é meu irmão – penso, enquanto encolho as pernas.
Contar carneiros talvez ajude. Me pego imaginando-os pulando a cerca branca de uma bonita fazenda. Até os carneiros roncam.
A luz parece piscar cada vez mais rápida. O ronco agora é constante. Fecho os olhos, mas não consigo pensar em mais nada a não ser, no leão que ruge a poucos metros e no maldito show de luzes coloridas. O fim do mundo anunciado mais cedo, agora não me parece mais tão absurdo. Novamente escoro os pés nas costas do guarda-roupa. Mais uma vez, ele balança. Ouço um último roncar. Não resisto. Agora sim que não durmo mais.
-Universal! exclama meu irmão, enquanto mostra um aparelho em suas mãos – um carregador universal. Carrega qualquer tipo de bateria de celular.
Ligou o aparelho em uma tomada a fim de testá-lo e já fazer uso da nova aquisição. Luzes coloridas saem do carregador, azul, vermelho, verde, amarelo, é fascinante. “Todos os tipos de bateria! Que aparelhinho incrível” – penso, enquanto sorrio e me preparo para dormir.
Aos pés da cama, há um pequeno guarda-roupa que divide o quarto ao meio, de costas para mim e de frente para a lateral da cama de meu irmão. Enquanto espero o sono chegar, observo, no escuro, as luzes coloridas do carregador refletidas, agora mais intensamente, nas costas do guarda-roupa. As cores ditam um ritmo frenético que proporcionam um verdadeiro show de luzes.
O tempo passa, o sono não chega. Já escuto um ronco baixo vindo do outro lado do quarto. O barulho aumenta. Já é a décima vez que mudo de posição na cama. Mesmo com os olhos fechados ainda noto a luz do carregador piscando incessantemente. Abro os olhos. Na rua, o som de uma ambulância combina com a luz dentro do quarto.
Chamo meu irmão uma vez, para ver se ele acorda. Sem sucesso, volto a me revirar na cama. Mais alguns minutos se passam, o barulho agora já se confunde com o som dos carros que passam. Apóio os pés no guarda-roupa. Ele balança.
Insuportável! Mas é meu irmão – penso, enquanto encolho as pernas.
Contar carneiros talvez ajude. Me pego imaginando-os pulando a cerca branca de uma bonita fazenda. Até os carneiros roncam.
A luz parece piscar cada vez mais rápida. O ronco agora é constante. Fecho os olhos, mas não consigo pensar em mais nada a não ser, no leão que ruge a poucos metros e no maldito show de luzes coloridas. O fim do mundo anunciado mais cedo, agora não me parece mais tão absurdo. Novamente escoro os pés nas costas do guarda-roupa. Mais uma vez, ele balança. Ouço um último roncar. Não resisto. Agora sim que não durmo mais.
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